sábado, 5 de julho de 2014

A dicotomia de um país racista com seu ego insuflado

O patriotismo que supera a razão

Imagem da Intenet - Google
O Brasil tem um antagonismo interessante: ou se deprecia com a velha máxima “só no Brasil isso acontece” ou insufla demais seu orgulho pela terra como se fôssemos criaturas superiores. Dentro disso surgem questões preocupantes, como o preconceito latente  – acredito eu - derivado de uma dificuldade de aceitação de nossas próprias origens.

Quando a pauta é esporte, principalmente o futebol, essa relação social se torna muito mais nítida.  Ao vermos um torcedor brasileiro no auge de sua fúria classificando um atleta latino como “macaco” estamos diante de uma relação de poder, talvez gerada não apenas por nos acharmos superiores no futebol, mas também por estarmos (teoricamente) em situação mais confortável economicamente, afinal somos os emergentes da vez.

No futebol somos a “casa grande”, aí o patriotismo vem com força total. Ninguém repara em nossas mazelas, ninguém nota se um viaduto caiu e matou dois. O assunto mais importante é que “aquele macaco” deu uma joelhada “criminosa” em nosso menino Neymar.

Neymar, por sua vez, também já sofreu com ataques racistas na Espanha, onde atua. Aliás, na Espanha alguns gostam de chamar os brasileiros de “macaquitos”, é nós rebatemos chamando eles de racistas e dizendo que aqui pelo menos temos empregos, estamos em ascensão econômica (estamos?) e eles no abismo da recessão.

Hoje o Brasil vive um momento curioso, existe um movimento forte de elevação do moral nacionalista. Virou falta de patriotismo criticar qualquer coisa, é o combate ao famoso “complexo de vira-lata”, o que pode ser positivo em certos aspectos, mas essa também pode ser um fenômeno ideológico nocivo. São as formas simbólicas de estabelecer um status. Acho que o Estados unidos devem ter passado por isso até acreditarem que são o centro do mundo.

É lógico que esta é uma análise rasa de uma situação muito mais complexa, mas espero que este crescente patriotismo não nos torne um país hipócrita, que nega suas raízes e se coloca como superior aos demais.  O caso do preconceito contra o jogador colombiano pode ter partido de uns poucos idiotas e ser um caso isolado, mas também pode ser o reflexo de uma nova visão que os brasileiros têm de si mesmo.



segunda-feira, 30 de junho de 2014

Em tempos de Copa: Brasil, Líbano e a mídia em campo

O Fantástico deste domingo (29) apresentou uma reportagem sobre a situação da mulher no Líbano. E, sim, por lá existe violência contra a mulher, baseado em um machismo exacerbado, que oprime e coloca o ser feminino como inferior.

Em certos países árabes a situação da mulher é algo degradante mesmo, com casos de violência extrema que merecem a atenção mundial. Normalmente, estas situações são fundamentadas em questões culturais e religiosas.

Nascer mulher nestes lugares é penar até o fim. E aqui no Brasil? Ah, aqui é o país da liberdade, as mulheres são valorizadas e tratadas como... (Ops!) Tratadas como mercadoria! Ah, mas, esse era justamente o tema da tal matéria do Fantástico. Parece que temos algo errado nisso aí.

Curiosamente a matéria que precedeu a da violência contra mulheres no Líbano mostrou a “pegação” nas ruas do Rio e São Paulo. Muitos gringos - que vieram ao país por conta da Copa - encantados com as mulheres brasileiras. A imagem da mulher brasileira sempre foi vendida no exterior. Reparemos na palavra: vendida.

Recentemente o apresentador da  Globo, Luciano Huck, iniciou uma campanha incentivando brasileiras a conquistarem “os príncipes encantados gringos”. Isso não seria uma espécie de cafetinagem? Em tempos de governo tentando inibir o turismo sexual no país, uma concessão pública de televisão usa de sua prerrogativa para, deliberadamente, oferecer mulheres a estrangeiros.

Na reportagem sobre o Líbano, as brasileiras foram alertadas sobre casamentos com aqueles homens, mas na matéria seguinte parece que os gringos que vieram para Copa eram muito legais, pois, a ideia era “ensinar” os moços como “pegar” mulher brasileira.

Hipocrisia é o nome disso. Diariamente mulheres brasileiras são violentadas em seus direitos, apanham e são exploradas de diversas formas. Aqui, a mídia colabora para explorar os atributos físicos em campanhas (e reportagens) e no fim, tudo isso ajuda a levar para fora a imagem do Brasil como paraíso para o turismo sexual.




sexta-feira, 21 de março de 2014

Convivência harmoniosa em Foz é apenas um discurso bonito

Quando cheguei em Foz achava tão bonita particularidade das “mais de 70 etnias convivendo harmoniosamente”, até usava em meus textos sempre que podia. Depois de um tempo passei a desconfiar, pois não via tanta harmonia assim.

Hoje sei que isso é apenas um discurso bonito, pois aqui as pessoas se toleram, ou toleravam. O estigma dos “turcos” está aí para provar, talvez eles – os árabes – sejam os que convivem há mais tempo com a (in)tolerância ao lado dos paraguaios, é claro.

Por falar em preconceito, estamos nos tornando uma cidade estranha com relação a outros aspectos. A morte da estudante uruguaia Martina Piazza, cujo assassino levianamente argumentou motivação religiosa para o crime, apontou para a desgraça do preconceito com relação às religiões de matriz africana. Ouvimos muita bobagem nas ruas, nas redes sociais e até na mídia.

Alias, Martina era unileira e esta característica também é um dos alvos do momento. A chegada dos estudantes latinos trouxe na cidade alguns olhares “tortos”e adjetivos pejorativos para classificar os acadêmicos estrangeiros.
Outro fator que precisa de analise e urgente atitude é o preconceito de gênero, que por aqui tem se manifestado de forma cruel. Para quem não sabe, já estamos na quinta morte violenta de mulheres somente este ano.

Talvez seja a hora de abandonar o discurso bonito de harmonia e partir para uma reflexão séria sobre o assunto e aí sim buscarmos a essa tal convivência pacífica que Foz precisa e merece.


sexta-feira, 7 de março de 2014

Um texto hormonal

Passei o dia ensaiando para escrever um texto para o Dia Internacional da Mulher, como faço todos os anos. Vi muita coisa boa na internet, textos bem escritos e fundamentados.

Queria fazer algo diferente, mas sem fugir à ótica política. Não consegui. Sentei em frente ao computador várias vezes e nada. A cólica não deixou, me oprimiu o dia inteiro e o cérebro não conseguiu dar vazão a nenhuma das ideias que tive.

Os únicos textos que saíram foram mensagens de celular para meu noivo, em quase todas reclamando de cólica e dor de cabeça. Meu corpo havia esquecido dessas “intempéries”hormonais (passei quase seis anos com DIU).


Enfim, o texto político não veio, mas hoje não esqueci nem um minuto que nós mulheres, além das batalhas diárias que a sociedade nos impõe, ainda temos de encarar muitas delas com cólicas.

segunda-feira, 24 de fevereiro de 2014

E os “muambeiros”, vamos escondê-los?

Para muitos foram anos dourados, mas hoje é motivo de vergonha - Google Imagens
Alguns políticos e outras autoridades de Foz ficaram escandalizados com um trecho do samba-enredo da Escola de Samba Tom Maior, de São Paulo, que este ano homenageia a Terra das Cataratas.

Na homenagem, pelo centenário da cidade a letra exalta as belezas naturais, a lenda das Cataratas, Itaipu, chama o local de “maravilha do Brasil” e, pelas tantas menciona  o trecho que tem gerado o alvoroço: “Olha o muambeiro trazendo de lá/No jeitinho pro lado de cá/ Na amizade dá prá negociar” (...)

Ora, por aqui nunca teve “muamba”, ninguém “puxou muamba”, Foz não ficou conhecida também por causa das mercadorias do Paraguai?  O contrabando existiu e ainda existe em nossa terra. O enredo fala da história da cidade – pelo menos da parte mais conhecida. E negar isso é no mínimo hipocrisia.

Não há dúvida que estamos em outros tempo e a “muamba” já não é algo tão presente no cotidiano de Foz. Nada mais de descaminho,  o caminho agora é o turismo, é divulgar as belezas naturais, sem esquecer, é claro, das comprinhas em Ciudad Del Este e no Duty Free da Argentina.

Se o “muambeiro” citado no samba da Tom Maior é motivo de constrangimento, vamos negar uma passagem de nossa história, vamos renegar aqueles que durante anos percorriam as ruas de Foz em busca de seu sustento e que sim; ajudaram a fazer no nome desta cidade e garantir o ganha-pão de muitos aqui. Houve ilegalidades? Sem dúvida, mas até isso faz parte do enredo de Foz do Iguaçu. Temos a opção de contar somente a parte bonita, mas aí a história não será tão verdadeira.

Publicado originalmente no Portal H2FOZ